quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Casa-mata


Como na semana passada, a cunhada voltou a me perguntar pela vida amorosa. O almoço em família é assim, parentada, cachorro e papagaiada. Guetos se formam nos vários ambientes, sala, copa e quartos, onde a meninada se reveza no computador e nos canais animados. Ventiladores de teto a toda, burburinho em uníssono, latidos se sucedendo a cada campainha. Risos, tilintares, tampas de panela batendo. Nessa profusão de sons e itinerantes, chego até a copa, onde a mensagem de minha cunhada, míssil teleguiado em meio ao vozerio, me acerta em cheio. Decibel zero no recinto. Imobilidade geral. Até o cachorro parou de abanar o rabo. Como um imã, desvio o olhar para a minha mãe, que já está com a alça de mira por cima dos óculos. Como já havia desconversado no último domingo, vi que um segundo descarte não seria bem-sucedido. Naquele átimo, fixo o olhar na minha cunhada e sorrio. Era só para ganhar tempo, já que não queria mais esconder a minha jovem paixão. Na verdade, queria ver até quando o suspense ia segurar o silêncio. Resolvo girar a cabeça como um tanque de guerra que observa a amplitude do front. Devolvo numa artilharia pesada, do calibre dos meus 45, que a minha companheira é uma guerrilheira dos seus 23. Minha mãe afunda a cara na cuia. Minha cunhada não segura o queixo e nem os olhos na órbita. A amostra do familiame em volta me olha e se entreolha. A empregada que vinha no rotundo trajeto de sempre deixa a panela cair sobre a mesa. Eis o silêncio quebrado. A vida volta ao normal. O cachorro late, uma risada corta a sala até meus ouvidos, algum carro é ligado na garagem. Entre bafafás e zunzunzuns, sento-me e sirvo-me com a faca e o queijo na mão. Sintonizo em meio ao murmurinho comentários cáusticos, que vão desde o “que absurdo” até o “minha nossa senhora”, passando pelo mais leviano de todos, que é justamente aquele que você não escuta. Levanto mais uma vez a boca de fogo e cuspo: aqui, me deixem comer em paz?

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